Ser "cult" custa caro em Porto Alegre

Não há um levantamento estatístico sobre a questão, mas tenho praticamente certeza que Porto Alegre é a capital, ou uma das, onde se cobra o maior preço de ingresso para assistir shows e espetáculos de teatro. A capital gaúcha recebe uma quantidade razoável de atrações nacionais e internacionais, porém, os preços que são cobrados por uma entrada são pornográficos, para dizer o mínimo. Impossível conseguir prestigiar duas atrações por mês. É amigo, ser "cult" custa caro. Muito caro.
Enquanto falta incentivo para produção local, os espetáculos que desembarcam em Porto Alegre parecem ter vindo diretamente do tempo em que a inflação beirava os 110% ao dia. Atrações que em capitais como São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro custam, em média, R$ 80 chegam aos porto-alegrenses por não menos do que R$ 120. Quer um exemplo? A turnê de João Gilberto, que iria ser realizada ano passado, tinha o ingresso mínimo com preço de R$ 700 na capital gaúcha. R$ 200 a mais do que em São Paulo, por exemplo, que é doze vezes maior em termos de econômicos e populacionais. Nem na Europa se cobra tão caro.
Outro exemplo? Recentemente as cantoras Marisa Monte e Maria Rita, duas das maiores vendedoras de discos do Brasil, circularam com turnês que contavam com aporte da Lei Roanet, principal mecanismo de financiamento cultural do Ministério da Cultura. Ou seja, dinheiro público empregado em espetáculos que tinham ingresso mínimo custando mais de R$ 200. Aqui no Rio Grande do Sul, em outros tempos, a Lei de Incentivo à Cultura chegou a financiar espetáculos de grupos como Sandy e Jr e dar carta branca para uma só empresa captar recursos como bem quisesse (e sem prévia aprovação dos projetos) via abatimento fiscal de ISSQN.
As produtoras "mainstream" poderão alegar que os artistas vem para cá dependendo da venda de ingressos de bilheteria para custear todos os gastos, que não são baixos, de um espetáculo vindo de Rio e São Paulo ou de fora do país. Porém, a questão vai um pouco além disso: é muito conveniente sobretaxar os tickets para capitais periféricas, onde o público carece de grandes espetáculos e mesmo assim receber incentivos fiscais e captar recursos para estes projetos para torná-los viáveis. A mão dupla não funciona quando o preço cobrado pelo ingresso, supostamente incentivado, chega a niveis altamente salgados.
Quem não gosta deste tipo de atrações tem uma série de opções com preços muito agradáveis e até mesmo de graça na cidade. A produção local de música, teatro e dança sofre com poucos mecanismos de viabilização, porém, vez ou outra nos surpreende com boas empreitadas. Basta saber garimpar um pouco. Porém, não se pode deixar passar em branco quando os preços cobrados pelos ingressos beiram o absurdo. Não é porque vamos consumir um produto cultural que não podemos reclamar quando nosso bolso é assaltado, mesmo que ao som de boa música.

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